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Só tem cicatrizes quem sobreviveu

Só tem cicatrizes quem sobreviveu
Letícia de Souza Andrade
out. 3 - 9 min de leitura
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Eu estava assistindo uma série na TV quando minha mão tocou na minha mama e sentiu que tinha algo mais ali. Imediatamente fui me tocar e percebi que não era impressão.

Sempre realizava exames de toque mensais e diariamente na hora do banho era muito comum também sentir minhas mamas porque Fisioterapeuta meio que é o profissional que “tem olhos nas mãos”. 

Mantive a calma, agendei minha ginecologista e estava tudo dentro do programado, já que fazia sempre os meus exames anuais no segundo semestre (era agosto) e eles estavam todos em dia. No dia da consulta a médica desmarca pois estava com COVID então eu já decidi agendar um mastologista direto já que era especialista em mama, mesmo eu tendo a certeza de que era apenas um cisto como milhares de mulheres possuem. A consulta acabou sendo marcada para uma data após uma viagem que já estava agendada há meses e eu fui viajar com minha cabeça a mil por hora. Nessas horas parece que o peito começa a doer, o caroço vira uma bola enorme, você tem milhões de sintomas em relação àquilo que está dentro de você.

Em uma madrugada qualquer de insônia apareceu no stories de uma amiga de faculdade o vídeo da Mari falando sobre seu segundo câncer. Ali eu tive a certeza que era um sinal, pensei comigo “Letícia você está com câncer e esse vídeo Deus colocou agora para te mostrar que não é tão difícil quando mostra nos filmes”. Enfim… assim aguardei até a consulta. 

A minha primeira consulta foi péssima. A mastologista mal olhou para mim, mal ouviu a história e ao avaliar disse apenas que pediria um ultrassom e mamografia, as quais marquei para 2/3 dias depois. Nesse período a angústia já era enorme e ao conversar com uma amiga ela me encaixou na agenda de outra mastologista conhecida dela. Nessa consulta eu já levei os exames de imagem e a médica me disse que pelos exames iria pedir uma biópsia para saber maiores informações, se o nódulo fosse benigno iríamos manejar em ambulatório e se fosse maligno iria fazer algumas quimios e cirurgia. Bom por incrível que pareça ela me explicou de maneira tão leve que eu até fiquei tranquila. Além da biópsia ela me pediu para agendar o cirurgião que iria me atender já para conhecê-lo e adiantar o processo (o meu hóspede tinha 4,7 cm e iria ser operado mesmo sendo benigno segundo ela) e consegui a consulta na mesma semana.

Lá fui eu, sozinha, no médico já que até então estava só esperando o dia da biópsia para ter maiores informações. Ao sentar na cadeira e ele começar a ver os exames que eu tinha, enquanto eu ainda contava o que estava acontecendo ele simplesmente fala:

  • o que você tem é câncer de mama. Você vai ter que fazer umas sessões de químio, já te adianto que seu cabelo vai cair antes que me pergunte, uma cirurgia depois e vai viver mais 50 anos.

Bom, eu não consigo descrever o buraco onde eu fui parar depois desse momento. Tirei a roupa para fazer o exame mas eu não estava mais ali! E quando ele me indagou se eu tinha dúvidas eu só respondi “tenho algumas mas agora não consigo falar sobre nenhuma delas”. Ele me deu alguns exames de imagem para ver se “aquilo ali não tinha se espalhado” e eu saí do hospital arrasada! Chovia, eu sai de lá andando pela rua para fazer a liberação dos tais exames e conversando pelo celular com 2 amigas que tinha contado o que havia acontecido, cheguei ao trabalho e chorei por 2 horas sozinha, como se eu estivesse literalmente perdida (essa palavra NUNCA tinha tido o mesmo sentido para mim do que nesse momento). 

Uma semana depois, biópsia feita e a angústia no peito até sair o resultado e ele não demorou. Eu estava atendendo uma paciente quando minha amiga me manda o print do exame “CARCINOMA” estava lá escrito. Junto do print tinha um áudio que ela falava “é isso aí amiga era o que já imaginávamos, já estou aqui com seus exames e encaminhamentos amanhã já vou te mandar tudo pelo motoboy já agenda tudo e é isso, vai ficar tudo bem”. Anestesiada me definia nesse momento. Essa mesma noite uma outra amiga foi me pegar no trabalho para sairmos e eu lembro o quanto choramos juntas naquele carro, inclusive as lágrimas caem agora do meu rosto sem querer lembrando desse momento vivido. 

Nesse momento contei aos meus pais, sou filha única, e decidi também abrir na internet sobre a doença, afinal eu tinha certeza que seria apenas um capítulo da minha vida e eu ia querer vivê-lo normalmente dentro de toda caminhada do tratamento. 

A primeira químio eu fui tranquila, naquele pensamento de “vamos ver o que vai ser isso aí”, depois da químio fui até trabalhar e descobri nesse mesmo dia que não seria possível fazer isso já que enjoei bastante todos os primeiros dias de químio vermelha. É louco porque você não se sente paciente oncológica até aqui. A primeira sensação de “sim Letícia Andrade você é uma paciente oncológica” aconteceu 14 dias após a primeira aplicação durante o banho onde junto com a água do shampoo os meus cabelos começaram a cair. Essa sem duvida foi a minha pior parte do tratamento! A pior! A sensação de impotência diante disso é tamanha que eu não consigo nem escrever sem chorar lembrando desse dia! Eu não tive coragem de esperar cair e 2 dias depois, acordada com milhares de fios de cabelo na cama, eu decidi raspar a cabeça sozinha e assim o fiz! Simples! Fiz o que tinha que ser feito e agora o lance era ver como me sentiria bem: peruca, lenço ou carecona mesmo, e eu escolhi o carecona mesmo porque já disse a vocês que encarei como um capítulo na monha vida e eu não tinha porque esconder a falta de cabelo de ninguém! 

Bom o que se seguiram foram 4 sessões de químio vermelha quinzenais, 12 sessões de químio branca semanais, uma cirurgia de quadrante com simetria da outra mama, 15 sessões de radioterapia e agora hormonioterapia. 

Durante as vermelhas enjoos, indisposição e cansaço nos 3 primeiros dias e depois vida normal. Durante as brancas um sono absurdo no dia da aplicação e quando acordava era vida normal novamente. Eu só parei de trabalhar após a cirurgia que foi tranquila demais. Durante as rádios a vida também foi muito normal. Com a hormônio eu tenho poucos sintomas, tento ter uma vida saudável como antes e não reclamar das dores articulares, acreditem que não reclamar ajuda muito! 

Hoje eu já tenho cabelos, minhas unhas já estão fortes e eu ganhei meus peitos remodelados e lindos. Quando olho para a caminhada eu sei o quanto que ela foi penosa mas o quanto eu sou grata por ter caminhado pelos seus caminhos da maneira mais leve possível. 

Lá no início eu me peguei pensando se eu teria fé o suficiente para viver todo o tratamento, já que eu nunca tinha sido daquelas pessoas que vão a igreja, que compartilham orações e tudo mais, eu sempre conversei com Deus mas afinal será que eu teria fé para me curar? Eu acabei percebendo que a fé não é palpável, não dá para mensurar, e hoje eu sei que tenho a maior fé do mundo porque eu nunca duvidei que eu me passaria por tudo aquilo, eu sempre tive certeza de que sairia do quarto escuro que é o câncer e que estaria hoje vivendo a minha vida da melhor maneira possível. 

O câncer ele não me ensinou a viver ou dar valor a vida, eu sempre dei valor até demais a tudo que eu vivia, mas ele me ensinou que eu não estou sozinha, que muitas pessoas gostam de mim e que eu posso contar com cada uma delas, seja durante um tratamento médico ou seja durante um pagode de domingo. E hoje eu sou extremamente feliz e grata a tudo e a todos que passam diariamente no meu caminho, não mudaria uma vírgula desse capítulo e já estou com a caneta pronta para escrever muitos e muitos outros capítulos dessa minha vida. 

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